Viagem
A viagem começou algo atribulada, alguns contratempos incluindo uma visita ao mecânico. Mas lá se arrancou...
Vários quilómetros deixados para trás e uma súbita paragem em plena auto-estrada, no túnel do Fundão, devido a um transporte especial que obrigou a interrupção temporária do túnel ao transito. Esta paragem fez com que a fome fosse saciada, á boa maneira portuguesa, estendeu-se a toalha em plena auto-estrada. Já se comiam os fantásticos pasteis de bacalhau quando reparo no camionista parado ao nosso lado... ofereci-lhe um pastel e ele em retorno, para grande surpresa e satisfação, dado a situação, sacou de 4 cervejas do seu "frigomobile"!!! Lindo!
Paragem Obrigatória em Belmonte, terra de Pedro Alvares Cabral, bonito Castelo e do alto pode-se contemplar a Serra da Estrela em toda a sua extensão.
Dia 1
Seguimos caminho. Chegamos a Idanha-a-Nova e depois de desbloqueada a situação do check in, cinzeiros e preservativos oferecidos pela organização, em cerca de 20 minutos entravamos no Boom 2006, "Para contrastar quem esperou 22 horas!", dizia o staff enquanto me cravava a pulseira de artista.
Ainda no carro seguimos o estradão de terra por entre as encostas das herdades da barragem.
Ainda não se via nada. Apenas se ouvia o silencio da noite iluminado pelo lindo luar emergente...
Tudo sem sinais de atividade festivaleira.Hora de Relatório 22:30, sexta, 7 de agosto.
O estacionamento foi logo após uns 100m da entrada, em locais devidamente particionados e orientados por vários elementos do staff, muito bem e sem problemas... ate nos apercebermos que estávamos a cerca de 2km da entrada do recinto, o peso das nossas bagagens começava a doer, mesmo antes de as carregarmos!
Começada a jornada pelas intermináveis estradas de terra, vislumbrou-se um imponente dragão no nosso caminho.
O primeiro pit-stop para recuperar forças...as primeiras fotos... outros boomers passam carregados ate aos dentes com a mesma cara de desgaste, mas moralizados... nada mau para cartão de visita, ah?!
Com muito esforço la se conseguiu montar a nossa barraca central, numa encosta ainda bastante longe do dancefloor, mas porque estávamos numa zona de ressonância o som era poderozissimo, apesar da grande distancia. Incrível, ali o som era perfeito! Se andasse uns 20m em direcção ao dancefloor o som deteorizava-se e era quase impercetível, nós estávamos mesmo no pico de onda!
Isso foi agradável como cartão de visita mas depois de passada a primeira noite, a cabeça já nao aguentava!
Depois da viagem com as tralhas de campismo desde o carro ate ao ancoramento estávamos estafados e não houve forças para sair nessa noite.
Dias Seguintes...
O meu relógio biológico acordou-me as 6 da manha, sempre aquele Psytrance a picar-me a cabeça. Mas logo me apercebi da recompensa. Olhei o horizonte e presenciei um lindíssimo nascer do sol, desde o primeiro raio. Bem... simplesmente lindo! E que paisagem! O escuro da noite e o nosso desorientamento escondeu o maravilhoso sitio onde nos encontrávamos.
Eu estava realmente satisfeito... magnifico!
Fui tratar da higiene, e dei por mim nos mais incríveis chuveiros que já vi, construidos em bambú estavam decorados com motivos adequados.
Fiquei impressionado quando vi que era uni-sexo e so tinha gajas á minha frente! Bem, que belo amanhecer! Gel de banho ecológico de cânhamo era fornecido em qualquer chuveiro, individual mas contiguo com os seguintes, separados apenas por uma fina cortina de serapilheira.
O regresso à tenda foi revelador do espírito e do mercado em que qualquer tenda de boomer se transformara. Uma rapariga parecendo ser Inglesa, de lenço estendido aos seus pés com amostras espalhadas do que vendia, apregoando qual feirante, a rapariga dizia " LSD, Ten Minutes, Mushrooms, Drops, Acids, coke ..."
Não ouvi mais porque já me ia distanciando em direção à tenda... muito degradante! Como não estou habituado a ver este á vontade com drogas duras, fiquei chocado.
Bem, eu afinal era o único aparte, ehehe! Rastafaris, frikes, fritos e bastante degredo era visto com muita frequência mas também havia povo com bom aspeto, sobretudo meninas, que com aquele misticismo próprio me fizeram quase perder a cabeça... quase... ai Cristina, ehehe!
O calor no Boom era insuportável, mais de 40 graus, nas horas de maior aperto só se estava bem perto da agua, e agua era coisa que não faltava.
A nossa praia favorita era na tenda chill-out, outra magnifica construção em bambú de onde emergiam os sons mais incríveis e relaxantes. Era aproveitada a estadia para se recolher o jornal diário e descansar das energias gastas.
O recinto era simplesmente gigantesco, acho que Ossela cabia la sem esforço, e com os cerca de 30mil boomers espalhados por tamanha área nunca em situação alguma tive que esperar em filas ou senti desespero pelo aperto das multidões. Muito pacifico e funcional, em tudo.
Mesmo a longa distancia ouviam-se os raios cósmicos do Dancefloor que varriam o espaço. Mensagens cósmicas percorriam centenas de metros para aliciarem seguidores, zombies vagueantes em sintonia, qual tribo a dançar ao som dos tambores sagrado dos xamãs em que coletivamente atingem um estado alterado de consciência, e ao som do trance encontram uma forma de partilha. Incrivelmente seguindo a linhagem mais antiga da humanidade - o êxtase xamanico que os transporta para alem do tempo.
Conclusão
Tudo se passava na maior sintonia, entreajuda e partilha. O que procurei neste festival foi uma união com esse espírito, vi e conheci muitas pessoas que me deram um pouco delas, enriqueci bastante mas também dei do meu tesouro.
Todo o festival pareceu-me completamente utópico, uma tribo que se une e partilha do mesmo espírito.Para quem não entende, só vê no boom drogas, frikes e degredo total (também os há, também os há!).
Mas quem assim pensa talvez não veja realmente mais nada, por ser só isso que conhece.
O boom para mim foi uma manifestação que ultrapassou por completo a existência terrena, mas sem lugar para alienações. Elevando-se no seu simbolismo, o festival ganhou um grande valor cosmológico e espiritual.
A presença da lua cheia serviu de ligador a toda a existência intersticial do boom, efémero na sua duração, porque o espaço não é para ser permanente, é para ser intenso.
É uma experiência que transforma as pessoas e desde o inicio, na alegria do reencontro, os corpos dão-se ao abraço, espalham-se emoções. Um enriquecedor foco de intensidade relacional vivido na primeira pessoa.
"WE ARE ONE"
Recordarei toda a vida e com muita saudade, esta grande experiência.
Uma intensa LIBERTAÇÃO.
Boom para todos.

















